terça-feira

janeiro de 2008, último mês de residência

28.01.08

“A história permanece na cidade.” Foi assim que o pai da Bel Lavratti falou se referindo a uma cidade berço de tantas estórias da nossa sociedade atual. Um fato que dá pra sentir. Todas as minhas estórias foram de Amor, a matéria básica de tudo que nos cerca.

25.01.08 Sexta-feira


“Life is more important than Art”. Email enviado pelo e-Flux com esse assunto de cabeçalho. Me fez pensar no todo desse conjunto bem vivido em Paris. Bem vivido sob meu ponto de vista. Deixei as flores de seis meses para trás – não todas, mas quase. Elas foram parte da instalação em Aubervilliers, na Villa Mais d’Ici, no dia 19. Foram oito horas de trabalho, entre arrumação do espaço, incluindo limpeza grossa, e a inserção das fitas nas árvores. Busquei compor como se fosse de fato um desenho com cor no espaço – assim em uma árvore ficaram as fitas amarela, azul turquesa e royal; em outra, branco, pink e lilás. Me satisfez intensamente. À noite, durante a festa, doei as flores presas por fios às pessoas, e dessa parte não tenho muito registro. Estava um tanto escuro. Mas todos participaram, fosse colocando nas árvores do jardim ou em si mesmos.
As idéias, é claro continuam brotando, elas não são restritas à residência. E isso sem dúvida é o que me faz considerar normal o retorno ao Brasil. Seis meses, da forma como vivi, é o momento em que me sinto mais solta para estar na cidade, pensando melhor o idioma e as pessoas. Dia desses pensei que talvez eu não tenha feito muita diferença para Paris, mas sem dúvida ela fez toda a diferença para mim. O eterno encontrar novas ruas, novos caminhos, palavras e expressões. Ouvido aberto, para os sons da cidade. Quantas fui e quantas me costurei.
O ganho que se tem a cada dia. Como hoje em que vi algumas Íris no jardim da cidade – talvez uma primavera antecipada, que faz com que as pessoas sorriam novamente. Uma cerejeira já em flor. Um perfume de cerejeira me tentando. Durante algum tempo, o inicial, talvez eu caminhe com a presença desse universo por São Paulo. Em parte pelas lembranças em si, em parte pelo desenvolver do meu trabalho, a execução em sai das foto-costuragens, o projeto escrito, a organização das fotos. Será preciso muita força de vontade para seguir em frente com as conquistas atuais. Mas é possível, e isso me fortalece.
A presença do lúdico, do humor, do sensível.
As cores e o pb. O reenquadramento. O passar a limpo. A Ju me falou da estranheza de ver as minhas flores após o término da festa. Eu as deixei lá por precisar seguir adiante, tanto eu quanto elas. O fato é que foram elas as estrelas dos seis meses, foram elas meu assunto, meu foco, parte dos objetivos. Elas passaram a ser eu para quem participou do processo. E por mais que eu saiba que há mais delas em SP, aquelas são únicas. Sei que algumas pessoas manterão consigo por quererem manter a mim.


16.01.08

Fui a Roma e ao Vaticano. Quatro dias de um universo que é a base da nossa civilização hoje, sede do Império Romano que perspassa o catolicismo e as leis que ainda hoje se aplicam. Mas independente disso é historia à flor da pele, com os resquícios do que existiu um dia. Ruínas. Porém ruínas que presenciaram muitas pessoas. Tudo tem uma dimensão gigantesca, mas não me senti oprimida. O coliseu é emocionante, arrepia pensar no que ele era – palco de um teatro de sangue, do cruel. Ao mesmo tempo ele não me parece fazer apologia dos sacrifícios, para que nunca se esqueça dos cristãos jogados aos leões,mas muito mais sua arquitetura em si e sua permanência.
No Vaticano, emoção desde o primeiro instante, na praça diante da Basílica – imensa! E então, todos os próximos momentos seriam emocionantes, a cripta dos papas, com a de João Paulo II, a Pietá de Michelangelo, o teto da basílica assim como o chão, as paredes... um imenso dossel indicando a área da cripta de São Pedro – é, ele mesmo estava lá. Uma imagem dele sentado ao alcance de nossas mãos, cujos pés já quase inexistiam – o fato de milhares de peregrinos os tocar vêm os apagando. O Museu é algo impressionante de tão gigante. A Capela Sistina não tem palavras que a descreva, muito menos a Biblioteca de lá. Só vendo, junto com as centenas de outros detalhes. Havia na parte contemporânea um imenso desenho de Matisse, que me pegou forte. Enfim, posso ter fotografado quase tudo o que vi, posso descrever em palavras e adjetivos diversos, mas Roma é uma cidade para se ver e lembrar.
Vim, vi e venci.
Talvez eu esteja disposta a viver cada dia como o dia em si. Assim sigo uma aparente normalidade, embora me preparando aos poucos para o retorno. Tirando fotos das paredes, revendo papéis, fazendo acertos.


08.01.08

Ontem dois pontos distantes em minha imaginação foram ligados por uma linha reta que começou em um jardim suspenso e terminou em outro. Do Faubourg Saint Antoine a Daumesnil através de uma passarela elevada, como um minhocão, porém de uma beleza sem igual. Havia ido aos dois pontos de forma independente, de metrô, sem percebê-los conectados. Foi bom voltar entendendo agora a geografia dos lugares. O espaço que eles ocupam em mim. Hoje é dia -20. O que falta para voltar.


06.01.08

Aprender a viver cercada de pessoas novas e novas situações é o que te aproxima do teu infantil, o olhar de uma criança diante de um mundo a ser descoberto. Quando o simples volta a ser simples por ser mágico. Sem complicações.
Povoar o mundo de coisas belas. Semear arte, semente que dá frutos-flores. O semeador saiu a semear...
Talvez só agora eu tenha me dado conta de como é fácil fazer essas instalações. Um material que qualquer um pode manusear de forma semelhante – as fitas que envolvem, os fios que pendulam, as flores que recortadas podem ser colocadas de X maneiras. Uma idéia fácil de se propagar, essa de jardins portáteis ou jardins faça você mesmo onde quiser fazer.



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